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  Radiodifusão digital
  A primeira geração da radiodifusão digital está sendo superada por tecnologias melhores e mais eficientes.
   
  Por Steve Buckley*

 
  23/04/2007

A digitalização da televisão resultou na proliferação de padrões de irradiação concorrentes, ao invés de uma convergência de uma plataforma digital única. Comparado ao rádio, no entanto, a escolha de padrões é relativamente limitada e a seleção pode ser feita pela administração pública de cada país de acordo com uma decisão de custo/benefício público e econômico relativamente simples.

No caso da radiodifusão digital, onde sistemas de transmissão digital tenham sido testados e desenvolvidos durante um período de tempo bem maior, a situação é mais confusa. A primeira geração da radiodifusão digital está sendo superada por tecnologias melhores e mais eficientes. Os países, empresas e consumidores que fizeram um investimento antecipado em sistemas digitais encaram agora a necessidade de substituir uma tecnologia de primeira geração cada vez mais obsoleta. É cada vez maior a proliferação de padrões. Para os países em desenvolvimento ou em transição há oportunidades de pular os primeiros estágios de desenvolvimento mas ainda há riscos de se comprometer com tecnologias ainda não testadas.

A digitalização do rádio, assim como a da televisão, promete a melhoria da qualidade técnica do serviço, o uso mais eficiente do espectro e maior funcionalidade. Em contraste com a televisão, no entanto, a adoção de plataformas digitais pelos consumidores tem sido lenta, mesmo em países onde os serviços de rádio são amplamente disponíveis em plataformas digitais.  Os principais motivos para isso são que, aparentemente, a qualidade do serviço não é o suficiente para convencer a audiência a mudar para o padrão digital, além do custo do equipamento de recepção digital ser muito superior ao seu equivalente analógico e das plataformas digitais não oferecerem uma escolha ainda maior na variedade e diversidade dos serviços disponíveis.

As agência de regulamentação no ambiente de radiodifusão digital confrontam-se, por um lado, com uma adoção relativamente lenta das plataformas digitais e, por outro, com as demandas concorrentes de possíveis sistemas de transmissão digitais, todas necessitando acesso ao espectro de rádio se elas desejarem se firmar. Ao mesmo tempo o avanço tecnológico, particularmente em técnicas de codificação de áudio, exige que os padrões digitais sejam suficientemente flexíveis para poder evoluir com o tempo sem a necessidade de substituir equipamento caro pelo consumidor.

As tecnologias já desenvolvidas ou em desenvolvimento para a radiodifusão digital situam-se em seis grupos principais. Três deles foram especificamente desenvolvidos para transmissão terrestre e são conhecidos como DAB, IBOC e DRM. Além disso, as tecnologias digitais de televisão DVB e ISDB estão sendo desenvolvidas para incorporar serviços de transmissão de som. Nenhum desses sistemas ainda foi aceito de maneira ampla. Finalmente, existe um grupo distinto e não-compatível de tecnologias desenvolvidas para rádio digital por satélite (SDR).

DAB, a primeira geração de radiodifusão digital, foi desenvolvido por um consórcio europeu1 no fim dos anos 80 e em alguns países, especialmente no Reino Unido, recebeu substancial investimento de infra-estrutura e promoção pública como a “nova” tecnologia. O padrão DAB apresenta uma melhoria da qualidade de áudio apenas marginal, sua aplicação exige novo espectro e para serviços de rádio locais (ao contrário de redes nacionais) não representa uma melhoria significativa da eficiência do espectro em comparação com sistemas analógicos. Uma tecnologia de codificação mais avançada foi apresentada com uma versão atualizada e conhecida como DAB+. Além disso, uma plataforma derivada que pode transmitir rádio e televisão foi desenvolvida na República da Coréia com o nome de DMB2. Infelizmente, a primeira geração de receptores DAB são incapazes de receber sinais DAB+ ou DMB e eventualmente terão que ser substituídos.

Uma preocupação adicional com o DAB, sob a perspectiva do interesse público, é a introdução de uma nova e poderosa função para o operador da plataforma DAB e o alto custo de infra-estrutura, inviável para muitos serviços de rádio rurais, de pequena escala ou comunitários3. A plataforma DAB funciona como um “multiplex” em que um mesmo sistema de transmissão pode carregar até 10 programas. Na prática esta característica somente é viável para cobertura regional ou nacional, ou para áreas urbanas que possam sustentar este número de serviços de programa. Onde o DAB foi aplicado, o operador do multiplex ganha uma posição de dominação que pode gerar maior concentração de mídia, a não ser que sejam tomadas medidas para garantir acesso justo e acessível à plataforma DAB, ou que haja a garantia de oferecimento de serviços de interesse público específico – como rádios comunitárias.

IBOC é um método geral ao invés de um padrão técnico específico. A sigla em inglês significa “In Band On Channel” e tem sido a abordagem preferida para a radiotransmissão digital nos Estados Unidos. Os sistemas IBOC oferecem sinal digital sobre um canal de rádio analógico. Em essência, IBOC é uma abordagem incremental à digitalização, com impacto mínimo em sistemas de regulamentação existentes ou na seleção de serviços disponíveis. Há dois sistemas IBOC em operação nos Estados Unidos, conhecidos como HDRádio4 e FMeXtra5. O Brasil, as Filipinas, a Tailândia e a França já se licenciaram para testar a transmissão de rádio HD.

DRM6 significa Digital Radio Mondiale, que é o nome tanto de um consórcio internacional como de um padrão de transmissão digital desenvolvido por este consórcio. DRM foi desenvolvido inicialmente para a operação nas bandas AM (até 30MHz) e particularmente para transmissão digital de rádios internacionais como a Deutsche Welle. DRM oferece transmissão a custo relativamente baixo e vem sendo considerado como um substituo viável para serviços de rádio AM existentes. Comparado à transmissão em AM ele oferece qualidade de som muito superior e maior eficiência de espectro. Uma versão extensiva do DRM, conhecida como DRM+, está sendo desenvolvida para bandas acima dos 30MHz, incluindo bandas de FM, e pode oferecer uma solução de transmissão digital mais flexível e acessível  que a DAB para serviços de rádio em pequena escala, rurais ou comunitários. A regulamentação dos serviços DRM deve ser semelhante à abordagem dos serviços de rádio analógicos.

Tanto o sistema DVB europeu como o ISDB japonês, discutidos na seção anterior e destinados à transmissão de TV, estão sendo desenvolvidos para radiotransmissão digital. Uma versão compacta do sistema DVB, conhecido como DVB-H, para sistemas portáveis (sistema de mão ou handheld), é de particular relevância à transmissão de som e pode tornar-se disponível rapidamente se mais fabricantes de telefones celulares embutirem chips DVB-H na próxima geração de celulares. Da mesma forma, uma variante do sistema japonês ISDB, conhecido como ISDB-Tsb, está sendo desenvolvido no Japão para serviços de transmissão de som terrestres.

Rádio Digital por Satélite (SDR) agrupa sistemas distintos e não compatíveis para a transmissão digital por satélite. Ao nível internacional tem liderança o sistema desenvolvido por Worldspace e pode ser captado na África, no Oriente Médio, na Ásia e na América Latina, e em desenvolvimento na Europa. Esse sistema está em direta concorrência pelo uso do mesmo espectro que na distribuição terrestre e por satélite de DAB. Nos EUA, XM Radio e Sirius Radio conseguiram uma base substancial de assinantes para serviços exclusivos em SDR. Os sistemas DMB, DVB e ISDB tem adaptações que permitem distribuição por satélite.

Em suma, a proliferação de padrões de radiodifusão digital cria um sério conjunto de desafio regulamentares no que se refere ao planejamento do espectro e na apresentação de novos serviços. Com mais de dez padrões diferentes disponíveis, cada um deles necessitando de um receptor diferente, e com nenhum destes padrões tendo alcançado aceitação ampla, a radiotransmissão digital ainda está longe de um estado de convergência e interoperabilidade. A abordagem administrativa à alocação de espectro envolve uma escolha entre padrões concorrentes cuja viabilidade é incerta a longo prazo, especialmente em termos de receptores a nível de consumidor. Abordagens com base no mercado não garantem de forma alguma a aceleração do desenvolvimento, e podem até diminuir sua velocidade. A incompatibilidade e a interferência causada entre os sistemas incompatibiliza a aplicação de um modelo de espectro aberto. Diante desta situação, vários governos tem iniciado uma revisão7 fundamental das diversas opções para a difusão de som e das suas práticas regulatórias tradicionais.

Para os países em desenvolvimento ou em transição seria correto admitir que, ao menos a médio prazo, os sistema analógicos tradicionais (AM e FM) continuarão a ser a forma dominante de rádio. Não seria recomendável investir no desenvolvimento de grande infra-estrutura e novos sistemas de transmissão digital de rádio até que haja maior certeza da viabilidade dos diversos sistemas digitais disponíveis, além de disponibilidade geral de aparelhos receptores a preços acessíveis às audiências dos países em desenvolvimento. Enquanto isso, a melhor política de regulamentação pode ser a de esperar que tecnologias serão bem-sucedidas nas economias mais desenvolvidas, de acordo com uma revisão regular de padrões técnicos em desenvolvimento e de tendências de mercado.

(Tradução: Ricardo Paoletti)

 

 

  1. Desenvolvido pelo projeto Eureka 147, ver http://www.worlddab.org
  2. Digital Multimedia Broadcasting, ver http://eng.t-dmb.org
  3. Já em 1992 um estudo do Conselho da Europa chamou atenção para as dificuldades que o sistema DAB representa para radialistas em áreas pequenas ou comunitárias, ver: Gronov, Lannegren e Maren (1992) New Technical development in the sound broadcasting sector and their impact on mass media policy, CDMM (92)18, Strasbourg: Council of Europe
  4. Desenvolvido por Ibiquity Consortiumm, ver http://www.ibiquity.com
  5. Desenvolvido por Digital Radio Express, ver http://www.dreinc.com
  6. Digital Radio Mondiale, ver http://www.drm.org
  7. Na França, por exemplo, ver: Republico f France (2006) “Consultation publique sur lês norms de la radio numérique”, disponível em http://www.drm.gouv.fr/IMG/pdf/consultationradionumvf.pdf
 
 

* Steve Buckley é Presidente da AMARC – Associação Mundial de Rádios Comunitárias

 
 
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